sábado, 31 de outubro de 2009

obstrução

muito perto do último dia do mês, no último dia da semana, nas últimas horas do dia, numa das últimas estações da linha vermelha do metrô de são paulo (sentido barra funda, claro), houve quem talvez tenha dado seu último suspiro diante da aproximação do trem e de repente pulado.
fodeu, porque morreu na contramão atrapalhando o tráfego, mesmo, sem tirar nem pôr.

se tentou morrer, espero que tenha conseguido.
senão... bem, acho que morreu de qualquer jeito.

terça-feira, 27 de outubro de 2009

irmão de alma, drummond

Meu Deus, por que me abandonaste
se sabias que eu não era Deus,
se sabias que eu era fraco.

terça-feira, 20 de outubro de 2009

teomania

"Não é megalomania", e essa frase tem surgido na minha mente com frequência nos últimos dias.
Basta sentar e precisar de uma distração, ou eventualmente ser atingido pela urgência em pensar no assunto que torno a negar, sempre em silêncio e sempre imerso no caos mental e no complexo de leigo, o que impede a idéia de evoluir.

De considerações a serem feitas antes do assunto ser introduzido de fato, existem ao menos duas: (1) megalomania se caracteriza pela ilusão da grandeza, do poder, logo (2) não sei se já a experienciei ou se ainda a experiencio.
Para todos os fins, o sentimento servido pelo texto não deve ser confundido com uma possível megalomania.

Fim das contas, não é megalomania.


... e no fim real das contas, é megalomania.
Uma forma extrema, aparentemente. Enquanto escreve o texto o autor dá um chute às cegas numa busca no Google e lá estava o termo: "teomania" - a ilusão patológica de ser um deus.
É megalomania.
É teomania.

É como se deus tivesse revelado todo o mistério e continuar esse texto tivesse perdido a graça.

terça-feira, 29 de setembro de 2009

passei

só pra dizer que toda genialidade tem um quê de limite.

segunda-feira, 28 de setembro de 2009

Fine With Me

Caught in ambitions, but without any idea
Focused on expectations, but driven by fear

With irrational movements of no rhythm or rhyme
We are performing a most absurd play
All those actors are crazy, the director is on drugs
But I found it's the much better way

To look into the sun
And leave my shadow behind
Set sail for the open sea

So whatever may come
Or whatever may go
In the end it's all fine with me...

I really don't care
I'm arriving on schedule,
Only I don't know where

With your purse full of money, but nothing to spend it on
Too busy to get anything done
Always in a hurry, and still always too late
Your battle just cannot be won.

You better look into the sun
And leave your shadow behind
Set sail for the open sea

So whatever may come
Or whatever may go
In the end it's all fine with me...

That journey we're on does not follow our ideas and plans
We're clutching at deadlines and schedules that never make sense
How stupid those things upon which we all seem to depend
As long as the journey feels good why care where it may end...


Everon

domingo, 13 de setembro de 2009

são

Um dia, Loucura, tu me encontraste.
Era noite chuvosa e eu jazia largado em uma poltrona; meus pais eram mortos e me lembrava deles à luz de velas.
Quando te aproximaste e me tomaste o braço com teu punho firme e tuas garras longas, sussurraste em meus ouvidos. "Eu sou a Loucura; eu sou tua ruína". Assim abriste teu manto difuso e toda luz de vela se apagou, enquanto eu afundava contigo e vislumbrava que tudo de fato ruía: amigos, amantes e empregados davam-me as costas; faces estranhas nos espelhos; via meu cérebro, minha cabeça estava aberta, minha mente estava exposta; havia uma mordaça em minha fuça!
"É mentira!", eu tentava gritar; "É mentira!"
Mas minha mordaça, Loucura, eram na verdade rédeas. E quando dei-me conta disso arranquei tua máscara e agarrei teu rosto para sussurrar-te de volta: "Não és ruína: és libertação".

quarta-feira, 9 de setembro de 2009

sr. presidente do senado

hoje a câmara dos senadores se localizava na minha antiga escola e o povo participaria de uma sessão. todos discursavam com indignação, inclusive minha mãe, e a maioria era interrompida durante suas falas, devido ao ego grotesco dos excelentíssimos senhores. na minha vez de falar fui interrompido por ninguém mais, ninguém menos que o senhor josé sarney, que durante sua oratória exaltada empurrou minha mãe. quem se exaltou fui eu, e levantei inflando o peito e batendo na mesinha pra alertar que o senhor presidente não tocasse em minha mãe. acuei o velho sarney, menor que eu, e ninguém impediu. ele reagiu tampouco, então pulei em cima dele e passei a agredi-lo das maneiras que primeiro viessem em minha cabeça.

ninguém impediu; ele ainda não reagia.
mas como era meu sonho, todo golpe que eu dava era motivo para cócegas...
sou fraco, nos sonhos.

apesar da fraqueza, machuquei o rosto velho do excelentíssimo idiota. saímos todos da câmara, e, enquanto me dirigia à saída da escola, contava minha façanha a quem eu conhecesse: "desci o sarrafo no sarney", "soquei o sarney"; e tinha amigos de todas as bandas, e todos gostavam de saber. fim das contas minha irmã veio avisar-me que haviam feito uma denúncia contra nós; acordei antes de saber por quanto tempo ficaria preso por ter concretizado a coisa que pulula no imaginário de todo povo.

segunda-feira, 31 de agosto de 2009

mais do mesmo

era um texto grande cunhado em lamento. mas me irritei.
sempre liguei pro caráter artístico dos meu textos mesmo aqui no blog, mas dá em nada, dá? coletassem todos os bons, e teria-se um conjunto de chorumelas curtas, subjetivas, desinteressantes; não arte. mesmo porque nunca soube estar informado, inteiro, conciso num movimento para produzir alguma arte dele. tenho hoje um projeto maior, mas longe da prática, ainda...

parte da madrugada irritei-me preenchendo currículos.

no começo da manhã tentei criar algumas metáforas: pintei a felicidade como um prédio em uso constante, e a insatisfação como um monumento inútil que você enxerga de qualquer ponto da cidade. destruir o prédio útil, tudo bem - pode-se construir outro em alguns meses; destruir o monumento escroto, jamais - que importa se se sofre com sua beleza de mármore? é moderno se machucar assim. esse ponto quero desenvolver mais, tenho a impressão de enxergar mil mentiras que absorvi durante a infância:
(1) os bons sentimentos não são fortes como sempre pareciam ser - são apenas bons, e precisam de uso constante para sua manutenção.
(2) os sentimentos fortes são tão bons apenas enquanto à distância - quando se tornam reais, são apenas bons.
(3) os sentimentos ruins viciam.
amor mesmo é uma construção cuja importância só será sentida a longo prazo. apaixonar-se por estrelas é uma idiotice. alcançá-las queima.

mas tive, en parejas, uma metáfora boa que vou guardar na geladeira, já que tratava de manjares, de passas. é justo.

quero dizer mais nada. não quero ser mais óbvio nem mais direto. quero continuar ingrato, covarde e ignorante para com os monstros que me fazem ser um deles.

quinta-feira, 20 de agosto de 2009

quiescência.

mesmo as palavras têm seu corpo e a pronúncia faz delas flechas concretas que, ao alvo ou a esmo, deterioram-se jamais. o tempo talvez as apague por falta de uso, mas fazendo jus às pontas de porcelana que têm, a ferida nunca sara e some jamais. em tempo, a decisão um pouco meditada é de quebrá-las todas flechas, que são armas de verdade e não abstratas como se costuma imaginar num desses surtos de ingenuidade e alienação.
a identidade está na abstração dessa fissura pelo universo físico, tocável, sensível. está no regalo ou na pressão dos olhos quando tudo à volta se cala, na apreensão em ouvir quando escuro ou na caça singela suave ao aroma quando este se apresenta - no distúrbio dístone e desritmado da voz jamais.
a preferência pela madrugada faz com que o sol nasça sempre mais rápido e puxe com ele todas as sinfonias brutas de um mundo moderno quebrado. não fosse a comunicação incapaz e incompleta dessa nossa raça deitaríamos toda noite numa cama fria sem ter, no dia, ouvido uma palavra sequer. que nessas formas corpóreas de expressão tudo que há é uma jaula onde o retiro epírito-mental é apenas mais um artifício de tortura e onde as camas são não mais que pequenos infernos dos quais não podemos escapar.
o silêncio, em vez delas. o tato, em vez delas. o olhar, em vez delas. a audição, em vez delas. pois as palavras são grávidas e ter sentido talvez seja responsabilidade demais para qualquer um que ouse gerá-lo. pois as palavras são avessas e eu sou apenas um pretenso prepotente sem ponderação que, na falta de audição e fala mais maduras, opta pelo não-dizer e se contenta.
meu processo tem nome.
ele se chama quiescência.

sábado, 1 de agosto de 2009

"ou sorrindo.", detalhe.

Além de continuar o que quer que eu esteja fazendo, agora é apertar os olhos, cruzar os dedos e abraçar os joelhos pra que hoje e ainda amanhã eu também esteja num lugar mais morno, apertado e aconchegante do que esse vasto e laminado quarto.

mais morno, apertado e aconchegante do que esse vasto e laminado quarto.

do que esse vasto e laminado quarto.

esse vasto e laminado quarto.

esse vasto e laminado quarto, mais vasto e mais laminado que uma planície em tundra, mais que o capim seco posto à prova por uma geada. qualquer nevasca é mais morna, apertada e aconchegante que esse vasto e laminado quarto.
nem quando entro o espaço ganha calor de vida, pois é como se tudo ali tivesse morrido há tempos e todo o recinto sido enterrado sob sete palmos de terra, pois luz nenhuma de sol nenhum parece bater às janelas para aquecer a inércia dali. fecha-se a porta e sobe um vento frio, deita-se na cama e ela te recepciona com um beijo gelado, independente de quantos edredons e cobertores deitam-se sobre você.
as paredes distanciam-se umas das outras, distanciam-se de quem lá dentro habita até deixá-lo só com seus próprios demônios; eis que o quarto é vasto, extenso até aonde a vista e o medo alcançarem, e sua grandeza inspira que o horizonte se torne ventania de folhas-lâminas de gelo seco em avanço feroz, voraz, punitivo.

cortam-se quaisquer pares neste vasto e laminado quarto.
neste lar só vive um.

quarta-feira, 29 de julho de 2009

enxerto das possíveis confusões sensoriais

estes olhos
que têm por chamariz o delicado
sabem nada do assunto.
"nada", diz-me o tato,
"é mais proveitoso do que o bruto".


~ ~ ~


voltando de ônibus da faculdade, antes de me entregar a um sono pesado, como última tarefa antes de dormir, para desencargo de consciência, vem a epifania na forma de versinhos e rimas possíveis, atacando-me puta da vida; tamanha a insistência que catei o celular e digitei-os como deu, e não reclamaram mais.
vem de novo n'outro dia, epifania.
há muitas idéias querendo parir.

quinta-feira, 2 de julho de 2009

to struggle

'Tis vain to struggle - let me perish young -

Lord Byron
das Stanzas to the Po

*

to struggle.
"to struggle" é vocábulo do inglês. parece que é traduzido frequentemente como o ato de se esforçar.
esforço. luta.

eu acho que a tradução faz pouco e que não existe correspondência exata, no português, pra struggle.
mas é porque, confesso, tenho toda uma pré-disposição a me insatisfazer com a suposta incapacidade da tradução; struggle me lembra visual e foneticamente o verbo estrangular. é por conta disso que acho feeling numa palavra talvez normal do inglês, é por conta disso que acho que suas traduções falham por não captar todo desespero existente nesse esforço, nessa luta.

porque aqui, pra mim, esforço é vulgar, luta é vulgar. não como struggle.
struggle é o peixe fora d'água, se debatendo pra voltar ao seu lugar a todo custo, mas já caiu na rede e da rede não sai mais.
struggle são os braços de quem é atacado por um travesseiro durante a madrugada, os braços que avançam cegos contra o atacante e jamais alcançam ponto vital, liberdade.
struggle é sufoco, asfixia.
struggle é desespero.
é esforço irresoluto.

struggle é convenção; a convenção à qual todos aderiram - de chamar tudo isso de "vida" sem a menor consciência de que são, na verdade, tempos confusos demais.
não é vida, é struggle.
struggle porque alguém fez o favor de lançar véus no mundo e do mundo fazer privada. a descarga são sonhos, dos quais acordamos perdidos e pesarosos pela efemeridade. assim começa o dia, então, e o dia inteiro faz-se da frequente necessidade de arrancar os véus de todas as coisas, mesmo que todas as coisas tenham muitos véus ou nenhum, há o desejo de arrancá-los sempre.
struggle não é somente estar nesse mundo, mas acordar do devaneio que a convenção cria e achar que, se há um motivo pra vida, é descobrir o que é verdade e o que é mentira.
e essa perda de tempo, caros, não é vida.
é struggle.

quarta-feira, 1 de julho de 2009

Trova

Duas vidas todos temos
muitas vezes sem saber:
- a vida que nós vivemos
e a que sonhamos viver.

Luiz Otavio
da União Brasileira dos Trovadores


~ ~ ~


Só essa trova, por hoje.
Depois faço um post sobre struggle.

terça-feira, 23 de junho de 2009

suspiro, em língua de p

no meu sonho, você morria.
eu, ciente do fato, só passeava pelo cemitério.
como sempre faço.

buscava mil distrações.
estava calmo.
tinha amigos ao redor, enquanto caminhava.
era todo gramado
tinha elevações pavimentadas,
tinha provavelmente mausoléus.

os grandes salões que imagino agora são só especulação. antes no sonho não apareceram, só pensei-os aqui, lembrando que, de repente, dei-me sentado num corredor de luz manchada em tons de vinho (vinho-vermelho-escuro, não vinho-roxo).
dobrava o corredor minha avó
em prantos secos, seguida de mais familiares.
seus olhos diziam-me
"Faltou você, neto"
mas não estavam tristes.
não comigo.

cerimônia supostamente acabada, dobrei eu o corredor em sentido contrário ao da avó.
conheci os restos do velório.
mais parecia uma festa, por onde você caminhava como se estivesse vivo.
conversava como se estivesse vivo.

ignorava-me como se estivesse vivo.


e se eu te procurava, você atendia.
explicava tudo parcamente, como se tudo fosse óbvio, e eu tolo demais para tudo entender.
depois sumia.
sumia como se nada tivesse acontecido.
como se você não tivesse morrido.
como se tudo entre nós não sobrasse assim.
e eu sabia
que mesmo vivo, ali, entre toda gente,
você morrera todo em minha mente
e a morte não se pode remediar.

sumiu-se para sempre.


e n'outro sonho contei tudo a ela.
quando acordei pensei na vida dela
e não na morte do senhor.

esqueci você até esta hora de dormir
pra que você de novo me assombre
e que em sonho de novo eu aprenda
a suas cagadas não repetir.

terça-feira, 16 de junho de 2009

o homem

All that is gold does not glitter,
Not all those who wander are lost;
The old that is strong does not wither,
Deep roots are not reached by the frost.
From the ashes a fire shall be woken,
A light from the shadows shall spring;
Renewed shall be blade that was broken,
The crownless again shall be king.

J.R.R. Tolkien,
em The Lord of the Rings

a cova

Aquele gosto amargo do teu corpo
Ficou na minha boca por mais tempo
De amargo então salgado ficou doce,
Assim que o teu cheiro forte e lento

Fez casa nos meus braços
E ainda leve, forte, cego e tenso
Fez saber
Que ainda era muito e muito pouco.

Faço nosso o meu segredo mais sincero
E desafio o instinto dissonante
A insegurança não me ataca quando erro
E o teu momento passa a ser o meu instante.

E o teu medo de ter medo de ter medo
Não faz da minha força confusão
Teu corpo é meu espelho e em ti navego
Eu sei que a tua correnteza não tem direção.

Mas, tão certo quanto o erro de ser barco a motor
E insistir em usar os remos,
É o mal que a água faz quando se afoga
E o salva-vidas não está lá porque não vemos.


Legião Urbana
em Daniel na Cova dos Leões

os leões

eu vadio, pai do filho d'O Homem sem ser pai de fato.
não fosse carpinteiro, seria vadio.
domador de leões.

vocês leões.
quem de escravo subiu à biga e esmagou as traições,
enchendo-se das graças e milagres à distância.
quem tomou três pedras e derrubou o gigante,
para ver morrer seu reino diante da promiscuidade e desimportância.

leões que me cercam na cova, reis poetas do passado.
eu mesmo tenho juba e olhos ferinos,
eu mesmo faço cerco ao meu corpo acuado, em mais de uma face.
meus leões eu dobro num voleio de meus farrapos cansados
- vocês eu encaro, sorvo da juba d'ouro sem tocá-la,
sofro a pane de cruzar-lhes os olhos sem recuar.
judá, e quem sobre o trono de judá reinou, reis poetas;
caiam por terra que já não me importam mais.

só sobrevivem hoje meus leões, dobrados e quietos nos bolsos.
mas passear por aí
passear por aí é como andar com meus leões soltos.

segunda-feira, 8 de junho de 2009

palavras como nós

como se fôssemos obra, uma obra só.
eu papel, eu caneta, eu tinta; você papel, você caneta, você tinta.
nós palavras, e nós palavras impossíveis de apagar, pois não se apaga tinta.
depois de escrita, a palavra a ninguém mais pertence.

nós palavras, como se fôssemos fruto das desvirtudes da hilda, do caio, quase sem vírgula, quase sem pausa para respirar; contínuos, éramos palavras de fôlego forte, de vontade, segredo (sem dúvida) de mesmo mote. nós palavras éramos prosa hilst, com medo dos pontos finais, com medo dos pontos sem nós (sem nós!); acontecíamos ao mesmo tempo agora presente, agora, presente, tudo ao mesmo tempo agora. nós palavras, texto natural, imoral, casual, passional - o crime que bem quiséssemos, fosse crime agir de impulso, crer na entrega e a entrega se tornar. cometido o crime, nós palavras éramos cúmplices.

toma os instrumentos
(eu papel, eu caneta, eu tinta; você papel, você caneta, você tinta)
toma a prosa
(eu papel, você papel, eu você, eu tinta, você tinta)
e nessa prosa ouve de perto quem sussurra:
"eu você, eu você, eu você - nós como palavras".
bota em verso
distribui pelos dias da semana
(da semana)
que cada estrofe um dia é
(pois é).
você é ana, eu sou zé.

então curta cada verso com calma,
que essa história de verso combina:
eu você, eu você - nós palavras de alma,
eu você, eu você - nós palavras de rima!

... que rima!, ai palavras, que rima!

uma vez fomos prosa, outra seremos verso,
uma vez somos texto, outra vez, o inverso.
acho que ponto sem nós eu não dou.
azar esse o nosso se num dia desses
o ponto conosco rimou.

segunda-feira, 1 de junho de 2009

O Poeta

[...]

Sou eu! que não esqueci
A noite que não dormi,
Que não foi uma ilusão!
Sou eu que sinto morrer
A esperança de viver...
Que sinto no coração! -

Riríeis das esperanças,
Das minhas loucas lembranças,
Que me desmaiam assim?
Ou então, de noite, a medo
Choraríeis em segredo
Uma lágrima por mim?

* * * * *

Fui um doido em sonhar tantos amores...
Que loucura, meu Deus!
Em expandir-lhe aos pés, pobre insensato,
Todos os sonhos meus!

E ela, triste mulher, ela tão bela,
Dos seus anos na flor,
Por que havia de sagrar pelos meus sonhos
Um suspiro de amor?

Um beijo — um beijo só! eu não pedia
Senão um beijo seu
E nas horas do amor e do silêncio
Juntá-la ao peito meu!

Foi mais uma ilusão! de minha fronte
Rosa que desbotou
Uma estrela de vida e de futuro
Que riu... e desmaiou!

Meu triste coração, é tempo, dorme,
Dorme no peito meu!
Do último sonho despertei e n’alma
Tudo! tudo morreu!

Meus Deus! por que sonhei e assim por ela
Perdi a noite ardente...
Se devia acordar dessa esperança,
E o sonho era demente?...

Eu nada lhe pedi: ousei apenas
Junto dela, à noitinha,
Nos meus delírios apertar tremendo
A sua mão na minha!

Adeus, pobre mulher! no meu silêncio
Sinto que morrerei...
Se rias desse amor que te votava,
Deus sabe se te amei!

Se te amei! se minha alma só queria
Pela tua viver,
No silêncio do amor e da ventura
Nos teus lábios morrer!

Mas vota ao menos no lembrar saudoso
Um ai ao sonhador...
Deus sabe se te amei!... Não te maldigo,
Maldigo o meu amor!...

Mas não... inda uma vez... Não posso ainda
Dizer o eterno adeus
E a sangue frio renegar dos sonhos
E blasfemar de Deus!

Oh! Fala-me de amor!... — eu quero crer-te
Um momento sequer...
E esperar na ventura e nos amores,
Num olhar de mulher!

Álvares de Azevedo

~ ~ ~


Mas esse poema, esse post, vai pro Hugo.
Que se há alguém além de mim que compartilha o sentido dessas palavras, é o cara.

sábado, 23 de maio de 2009

aprendi com elas

Se a planta está fraca e caída porque falta água, uma chuva só a esmagaria contra a terra.



É só uma constatação.

terça-feira, 12 de maio de 2009

Segismundo

Es verdad; pues reprimamos
esta fiera condición,
esta furia, esta ambición,
por si alguna vez soñamos;
y sí haremos, pues estamos
en mundo tan singular,
que el vivir sólo es soñar;
y la experiencia me enseña
que el hombre que vive, sueña
lo que es, hasta despertar.

Sueña el rey que es rey, y vive
con este engaño mandando,
disponiendo y gobernando;
y este aplauso, que recibe
prestado, en el viento escribe,
y en cenizas le convierte
la muerte, ¡desdicha fuerte!
¿Que hay quien intente reinar,
viendo que ha de despertar
en el sueño de la muerte?

Sueña el rico en su riqueza,
que más cuidados le ofrece;
sueña el pobre que padece
su miseria y su pobreza;
sueña el que a medrar empieza,
sueña el que afana y pretende,
sueña el que agravia y ofende,
y en el mundo, en conclusión,
todos sueñan lo que son,
aunque ninguno lo entiende.

Yo sueño que estoy aquí
destas prisiones cargado,
y soñé que en otro estado
más lisonjero me vi.
¿Qué es la vida? Un frenesí.
¿Qué es la vida? Una ilusión,
una sombra, una ficción,
y el mayor bien es pequeño:
que toda la vida es sueño,
y los sueños, sueños son.


Pedro Calderón de la Barca
em La Vida es Sueño, peça do teatro Espanhol

segunda-feira, 4 de maio de 2009

Travesseiro de Outono

Meu mundo laranja, marrom, dourado. Minha grama fosca, opaca, minha brisa veraneia que ainda não se foi. Aquele frio matinal, aquele Sol todo amarelo-pastel que cavalga implícito e sem graça até sumir – meu frio de fada, meu potro pastel, ambos meus, todos meus. Meu quintal de casa grande, grande e ainda mais vasto dentro de mim: era varanda, campo, arbustos, floresta de bambuzais; meu pátio vivo. Meus dias de Outono, minhas folhas de ouro levantadas do chão por um vento infantil.

Outono é o tempo dentro do suspiro entre o adormecer do cisne e o despertar da coruja, que se reúnem e se confinam numa mesma fronha, mesma cama de outono, meu travesseiro de plumas. E enquanto a cabeça pesa no macio da almofada e durante o sono do cisne e antes da coruja acordar, ele vem e me visita, dá-me um beijo e mil afagos que guardam meu sono, minha noite, meu outono. No dia seguinte o potro Sol é quase um corcel d’ouro, e a fada brisa, gelada rainha. O ar é todo denso e carinhoso, e seria colorido se não preferisse ser todo amarelo. Eu me faço correr pelo campo enquanto da varanda ele me observa, e corro e pulo com a leveza das folhas de outono que aprenderam a flutuar, e realizo que minha alegria tem o tamanho do brilho que os olhos dele tiverem, e vice-versa.

Nunca fui cisne, nunca fui coruja; jamais fui pássaro algum. Mas quando ele corria da varanda e atravessava o gramado ao meu encontro – quando me encontrava e me erguia do chão, braços envolvendo minha cintura como laços de cetim, mãos leves e o peito acomodando minhas costas, confortável como o corpo das corujas e dos cisnes parece ser – eu voava e era fantástico tal qual o bote de uma única coruja, tal qual cem cisnes povoando um lago em branco-pérola. Era como se ele fosse um travesseiro feito de ventos e, eu, leve como uma pilha de folhas que se espalha e se expande pelo ar em risadas, enquanto rodopiava e transformava todo meu mundo naquilo que meu mundo realmente era: um borrão multicolorido, dono de todo tom laranja, marrom, dourado; bambuzal, casa grande, quintal; corujeio, arenso, meu riso sem freio e o silêncio do sorriso dele ao pé da minha orelha, eternizado no abraço, no giro, no borrão de cores.

Nem em coruja nem em cisne; eu fazia minhas asas e alçava voo nos braços do homem que me assistira quebrando a casca do ovo e me ensinara a voar. Nele aprendi a tomar os céus mesmo depois que caíssem as folhas e que o mundo (meu mundo) caísse num azul-cinzento sem cura. Pois azul é a cor que segue a queda das folhas secas e a morte da brisa; e, do ocaso dos ventos, nasce o Inverno.


~ ~ ~


Começou como um desafio de produzir algo baseado em algum dos filhotes da Leila. Escolhido, tornou-se quase que involuntariamente uma singela homenagem a uma nativa dos Outonos e amante das folhas secas...
É a primeira vez que vejo uma coincidência que não é uma coincidência de todo.
Enfim, ei-lo(a).
Vou arranjar uma máquina de escrever.

quarta-feira, 29 de abril de 2009

longo prazo, revisão

tudo aquilo que havia comprado a longo prazo.
aquelas coisas que talvez durassem.

o presente de natal; uma caixa de bombons, a irreverência de um presente, de repente, a irreverência de bombons num natal. foi-se a páscoa e talvez já ninguém mais lembre, mas um diálogo haveria de ser assim:
- e os bombons que comprei no natal? lembra deles?
- claro que lembro.
mas não lembram.
a longa duração, quando completa, morre em si.
como as alegrias violentas de shakespeare.
shakespeare.

a agenda do ano; tão cheia de espaço, um desperdício só. uma falsa intenção que não está impressa nas páginas de papel reciclado, coisas que enganam gente desatenta e com dinheiro pra gastar.
- papel reciclado, vou levar. vou levar essa mesma.
babaca.
agora anota com cores diferentes os diferentes compromissos, os quais nem se dá o trabalho de lembrar; mal olha a agenda, mas direto a usa como desculpa: "agenda cheia!"
babaca.
usa bem a agenda, pode ser; houvesse ordem dentro da própria cabeça, faria melhor uso da agenda - ou, em melhor caso, uso nenhum.

ah, maço de cigarros; o único e provavelmente mais excitante maço de cigarros de palha que alguém já comprou. como se todos olhassem e julgassem o vício que aquele estava prestes a arriscar. mas sabiam de nada. por fora, tentava convencer o mundo que compraria o maço para extrair o fumo e guardá-lo - assim teria estoque para preparar um caldo, um caldo-remédio para pragas de plantas.
por fora, tentava convencer por dentro dessa mentira do caldo. por dentro, tentava se convencer que não era curiosidade.
dentre as dezenas de cigarros bem enrolados na palha, fumou dois no máximo; depois da primeira ressaca, fumou mais nenhum. o resto tornou-se apenas fumo, guardado pr'aquele bom fim. o sobre-resto foi doado a outro rapaz disposto a morrer por isso.
mas disposto a morrer também estava.

porque a longa duração ainda irrita.
ainda irrita.
se o corpo, a vida, tudo, se é prisão, estes tempos são decerto perpétuos.

quinta-feira, 23 de abril de 2009

Anda

Anda a raiar, ó dia!
Que tanta alegria há de raiar a poesia!


~ ~ ~



Autor desconhecido, versos sem título; escrito encontrado na porta de um banheiro da rodoviária de São Lourenço, MG.

quinta-feira, 16 de abril de 2009

O Trem

Que digo...?
Essa coisa toda de ser... essa coisa toda de ser poeta - melhor dizer logo -, tem altos preços.
E pagamos (vocês sabem) a duras penas, a longo prazo, em prestações de jamais-fim, com sangue, suor e lágrimas, como já foi dito antes por todo quem se atreveu a versar, rimar, dançar - com os próprios pés ou lá nos ombros dos gigantes.
É sina como toda longa dívida o é; basta descobrir qual dádiva ganhamos em troca de tamanha fúria destes flagelos que nos cobram.
Mas minto quando digo que não sei do talento que temos nós poetas. Mentimos as belezas a todos que queiram lê-las ou ouvi-las em voz alta, e mentimos de forma que sejamos agraciados e parabenizados em seguida. Nossos chicotes dificilmente partem das mãos dos outros: vêm de nós mesmos.
E o açoite vem sempre tal qual memória-falsa, tal qual intenção não-completa, tal qual futuro-ideal. Tal qual o imaginamos. Tal qual espera-eterna, tal qual uma estação de trem onde se senta no chão enquanto o trem não vem. Ele jamais chega. Apesar disso, sobe o aroma de combustível queimado, e no meio dele, os perfumes de outrem; antes exalados com tanta graça, agora menos que um veneno misturado a chamusque de óleo.
Passa-se mal com tal revertério - mas jamais passa a sensação de guarda, espera, longa espera. E o trem, que por si não passa nunca.

Quincas Borba, cão

Não lhe lembra nunca a possibilidade de um pontapé ou de um tabefe. Tem o sentimento da confiança, e muito curta a memória das pancadas. Ao contrário, os afagos ficam-lhe impressos e fixos, por mais distraídos que sejam. Gosta de ser amado. Contenta-se de crer que o é.

Machado de Assis em Quincas Borba

terça-feira, 7 de abril de 2009

stranger in a strange world

they'd do ev'rything I won't,
go on ev'rywhen I stay,
exist ev'rywhere I don't,
succeed ev'rytime I fail.

repente

olhos nos olhos e os meus olhos nos dela e os dela nos meus lábios; então os olhos dela nos meus e os meus nos seus lábios.
era a expressão pura do que os lábios queriam.
era o mais digno convite para um beijo.
o sublime e em tempo óbvio suspiro dos olhares certos de que o gesto almejado cairia em abstração eterna jamais capaz de ser.
encararam-se olhos e lábios.
matou-se o momento num “nunca mais” não-pronunciado mas subentendido no silêncio.

segunda-feira, 16 de março de 2009

manifesto paciente

E mil artifícios são criados para que nunca os outros saibam quem somos ou quanto temos a dizê-los.
Enquanto viverem, estarão constantemente sujeitos à subjetividade de crônicas, contos e desabafos que sozinhos jamais falariam as verdades sobre as quais foram tecidas suas linhas; quando mortos, enfim, serão (mais vivos do que nunca) personagens honrosos de toda fábula que nossa experiência gerar - convidados silenciosos e incapazes de quaisquer respostas.
Que estes nossos medos sejam perdoados: é a paciência que nos guia.

quinta-feira, 12 de março de 2009

brotando, de fato

No fim das contas os caules verdes eram mato - e mato brota onde nem se semeia. Pelo lado bom, já vi que pelo menos duas sementes da lavanda brotaram desde o começo da semana, e dessa vez não tem como se enganar.

No mais, o Balaio Branco está com idéias ótimas pra ilustrar um poema. Será interessante!


O ano começou com festa, calouros e grandes estréias no cinema; entre mil motivos pra continuar afogado nas simulações auto-destrutivas que eventualmente crio, decido ir ao médico, plantar flores e tocar os bois em frente.
Vamos nós.

terça-feira, 3 de março de 2009

brotando

Hoje quando fui checar e regar os canteiros percebi dois caules verdes em cada floreira. Pequeneninhos, mal acreditei quando vi, já que na embalagem dizia que a coisa toda levava por volta de duas ou três semanas - e preparei os canteiros na quinta-feira passada.
Vão crescer; quando vier o segundo par de folhas descubro ambos os canteiros pra tomarem Sol direto. Quando ficarem mais altas, reposiciono na floreira e quem sabe dou alguma mudinha pra alguém.

No mais, o blog está passando por reformulação - só de visual, acho.
Quase tudo pronto. Só concluo quando arranjar um e-mail novo pra mim.

quinta-feira, 12 de fevereiro de 2009

o que resta de mim

como dói o fim de uma paixão!
mas tem que ser assim
não tenho ar prá respirar
e não sei onde guardar
o que resta de mim!


~ ~ ~


nem sou o autor, ó.
apesar de querer ser. eu e o henrique achamos esses versos numa das telas em exposição no Conjunto Nacional. pior é que não consigo achar dados sobre a exibição dos quadros, que eram colagens, stencils, pinturas e escritos em tela. logo, não tenho nada sobre o autor dos quadros do poema.
fez uma mistura muito legal, o cara.

quarta-feira, 11 de fevereiro de 2009

transição

A criatura deixou as sombras assim que a criança sentou-se na cama e largou os cobertores que apertava contra o peito um minuto atrás.
"Você deveria estar com medo. Muito medo.", o monstro sibilou com sua voz gargântica, que mesmo no mais baixo dos volumes fazia o coração da criança bater mais rápido, como tremem as portas de uma casa mal-construída quando na rua passa um caminhão. E falava baixo, de fato, pois não queria acordar quem dormia nos quartos vizinhos: para que suas noites fossem satisfatórias só precisava se comportar tal qual um ladrão sorrateiro e assaltar suas vítimas sem que fosse percebido. Assim, aproximou-se mais um pouco dos pés da cama e concluiu: "Mas não está."
"Não estou mais."
"Mas deveria."
"Não mesmo. Olha só, sequer faz sentido." A criança se arrumou na cama, sentando para um dos lados e deixando o outro vazio, amassado. Deu leves tapinhas no espaço livre que deixara e o monstro se aproximou, correndo nas pernas curtas e sentando-se na cama num pulo só. Era comportado e não fazia peso contra os lençóis.
"Não faço?", rugiu baixo.
"Não faz. Você come sorrisos. Foi isso que me contaram. Mas você não colhe sorrisos de alguém que está assustado."
"Você conhece todos os sorrisos?"
"... não."
"Então não sabe que pessoas assustadas também sorriem."
"Eu sei, mas esses não são gostosos. São sorrisos desesperados e insanos. Não são gostosos."
"E os sorrisos de alívio, depois do desespero e do susto?"
"... talvez --"
"--são os melhores. Saborosos mesmo."
O bicho sorriu com vontade. Mil e um dentes pontiagudos se exibiam pra criança com certo sadismo e vontade, definitivamente vontade. A criança se assustou.
"... mas você não terá esses de mim. Não estou com medo."
"Nem um pouco?", engoliu o sorriso em seco, o monstro.
"... nem um pouco.", a criança concluiu. O monstro emburrou-se e pôs-se a encarar a parede vazia perto da cama. Aliviada, a criança suspirou com esforço, pois não é todo dia que se precisa esconder o alívio de um monstro sentado bem ao seu lado.
Por causa disso houve muito tempo até que alguém falasse alguma coisa, e foi o monstro que, infantilmente indignado, cruzou os braços e julgou, agora com a atenção no teto mas sem olhar a criança diretamente.
"Você me enganou!"
"Enganei."
"Por quê fez isso?"
"Se eu te dissesse que estava com medo, você ia esperar um sorriso de alívio. E eu não ia dar um desses."
"Por quê não?"
"Porque eu não sorrio. Sorriria até por ter te enganado, pela sua reação boba; mas eu não sorrio."
Parecia verdade. Até a criatura tinha sorrido durante aquela conversa, mas não a criança. Faltava-lhe algo que o monstro seria incapaz de identificar; não era especialista, era só um bicho que gostava de comer sorrisos. Só isso.
"É?"
"É. Sabe como, um dia você faz um monte de coisas erradas; tudo com pressa, sem vontade, cheio de ambições e vazio de idéias para alcançá-las."
"Você é uma criança, fazer errado é normal."
"Quê? Por onde você anda? O mundo não é mais assim. Esperam mais da gente."
"Hm.", e abaixou a cabeça, ligeiramente chateado. A criança explicava as coisas e às vezes olhava as janelas fechadas, com as mãos juntas sobre o colo. Os polegares se moviam como se não tivessem muita opção.
"Hoje se sorri por muito pouco. Com pressa, sem vontade, o mundo pede um sorriso e as pessoas não recusam. Sorriem de qualquer jeito, com pressa, sem vontade, e o mundo fica satisfeito. Aí o mundo descobre e tudo cai por terra."
"Estes são sorrisos de mentira. Conheço."
"Já comeu algum deles?"
A criança estava mais incisiva que antes; encarou o monstro com curiosidade, enquanto este se encolheu entre os ombros e fingiu observar as ranhuras do lençol.
"Um ou outro. Dá vontade de nunca mais comer de novo.", e não podia esconder o assombro e o incômodo para com o assunto.
Ouviu-se o som do peito de uma criança a encher e soltar em seguida, e a respiração perdurou, carregando a resposta pelo espaço vazio do quarto.
"É. Nunca mais."

sábado, 24 de janeiro de 2009

Cidadão Keane

Preciso dizer de alguma maneira que, apesar de ter me desfeito de todas as músicas e me distanciado das memórias musicais possíveis, eu ainda lembro do clima de cada canção e de como todo significado foi meu, só, e independente por completo de qualquer relação com o correr dos fatos.
Os fatos nem correm mais. Estão envoltos num simulacro eterno como num mar cuja água é pesada demais pra que a movimentação seja rápida, sequer possível.
Acabo me afogando nos trocadilhos.


~ ~ ~


Menção honrosa à minha visita à Expo da Campus Party pra encontrar a Clarinha, quadrinista que tem dois besourões verdes no lugar dos olhos. A partir dela, curiosamente conheci mais gente curiosa, entre eles o Rodrigo, do Balaio Branco, e o Faso, do .marcamaria (os mais fáceis de contactar, haha). O Balaio é uma revista de histórias que se envolve com várias mídias, e o .marcamaria é uma iniciativa que transforma posts em plushies. Tudo muito bacana, devo dizer.
Aliás, uma poesia que eu escrevi e a Leila ilustrou foi postada lá no Balaio, hoje! O link direto é esse, mas lhes aconselho a vasculharem todo o site. Comentem no que quiserem, também - se não comentarem há grandes riscos do editor puxar suas orelhas. haha
Agradeço a publicação, Rodrigo!

Abraços, povo [?].

quarta-feira, 14 de janeiro de 2009

444 minutos


numa demonstração de muita paciência, amor ao progressivo, e certamente de alguma desordem mental, resolvi criar uma lista com músicas que ultrapassassem os quinze minutos de duração. comecei a ouvir lá pelas... oito horas de ontem?, e ouço a última agora. sete horas e pouco de duração, é isso mesmo? os aproximados 444 minutos. experiência bizarra.

ao todo, há cinco discos inteiros na playlist. todos de uma ou duas músicas, apenas. o absurdo Thick As a Brick, do Tull; o surreal Seven Up, do Ash Ra Tempel com o Timothy Leary; Tubular Bells, do Mike Oldfield; o tranquilo Epsilon in Malasyan Pale, do Edgar Froese; e, pra terminar, o doentio (doentio) Third Reich'N'Roll, do Residents.

agora vou tomar um banho gelado e vou dormir, aproveitando que a música acabou enquanto eu finalizava o post.

domingo, 11 de janeiro de 2009

ensaiando últimas vezes

já tinha pensado nisso há um tempo; lembrei disso agora e quis por bem deixar registrado.
é um raciocínio sobre últimas vezes. uma conclusão, talvez, à qual cheguei repetidas vezes quando quis dar fim a algum comportamento: deixar de lado algum vício, mudar de rotina, etc. ou quando, ao menos, tentei fazê-lo.

reparei que últimas vezes não existem em tempo presente. existem muito menos em tempo futuro.
só há última vez se for no passado.
quem quer dar fim a algo não se pode dar ao luxo de dizer "esta é minha última vez", ou "esta será minha última vez", pois quando é assim a vez tende a se repetir. contenta-se então com as lembranças, solidificadas por um "aquela foi minha última vez"; com a última vez deixada no passado e jamais para se repetir.

uma última vez no passado tem mais valor que suas equivalentes do presente e futuro. últimas vezes do presente-futuro são (como este texto) ensaios de uma última vez verdadeira, larga e plena - que é a que se encontra no passado.

por exemplo, certo alguém que deseja parar de roer unhas roeu as unhas das mãos num Domingo. quando, no Domingo seguinte, sente vontade (e necessidade, eventualmente) de roê-las novamente, confronta-se com o desejo de dar fim ao hábito. pode, daí, escolher entre cortar o hábito com uma última vez definitiva - no passado - ou ensaiar a última vez, trazendo-a para o presente.
quando opta pelo passado, não rói. sua última vez já aconteceu e, por ser última, não se deve repetir. se continuar optando pelo passado assim que voltar a vontade, não acontecerá novamente.
quando opta pelo presente, rói consciente de sua condição em uma última vez, talvez por isso, um tanto quanto fingida. uma última vez ensaiada e mecânica por demais. pode, na próxima vez que surgir a vontade, optar novamente: concluir a última vez, escolhendo o passado; ou trair-se, ensaiando outra última vez.

eu, por mim, cruzo os dedos pra que esta seja a última vez que eu uso um exemplo tão chulo.

segunda-feira, 5 de janeiro de 2009

Mr. Tambourine Man

Hey! Mr. Tambourine Man, play a song for me,
I'm not sleepy and there is no place I'm going to.
Hey! Mr. Tambourine Man, play a song for me,
In the jingle jangle morning I'll come followin' you.

Though I know that evenin's empire has returned into sand,
Vanished from my hand,
Left me blindly here to stand but still not sleeping.
My weariness amazes me, I'm branded on my feet,
I have no one to meet
And the ancient empty street's too dead for dreaming.

Hey! Mr. Tambourine Man, play a song for me,
I'm not sleepy and there is no place I'm going to.
Hey! Mr. Tambourine Man, play a song for me,
In the jingle jangle morning I'll come followin' you.

Take me on a trip upon your magic swirlin' ship,
My senses have been stripped, my hands can't feel to grip,
My toes too numb to step, wait only for my boot heels
To be wanderin'.
I'm ready to go anywhere, I'm ready for to fade
Into my own parade, cast your dancing spell my way,
I promise to go under it.

Hey! Mr. Tambourine Man, play a song for me,
I'm not sleepy and there is no place I'm going to.
Hey! Mr. Tambourine Man, play a song for me,
In the jingle jangle morning I'll come followin' you.

Though you might hear laughin', spinnin', swingin' madly across the sun,
It's not aimed at anyone, it's just escapin' on the run
And but for the sky there are no fences facin'.
And if you hear vague traces of skippin' reels of rhyme
To your tambourine in time, it's just a ragged clown behind,
I wouldn't pay it any mind, it's just a shadow you're
Seein' that he's chasing.

Hey! Mr. Tambourine Man, play a song for me,
I'm not sleepy and there is no place I'm going to.
Hey! Mr. Tambourine Man, play a song for me,
In the jingle jangle morning I'll come followin' you.

Then take me disappearin' through the smoke rings of my mind,
Down the foggy ruins of time, far past the frozen leaves,
The haunted, frightened trees, out to the windy beach,
Far from the twisted reach of crazy sorrow.
Yes, to dance beneath the diamond sky with one hand waving free,
Silhouetted by the sea, circled by the circus sands,
With all memory and fate driven deep beneath the waves,
Let me forget about today until tomorrow.

Hey! Mr. Tambourine Man, play a song for me,
I'm not sleepy and there is no place I'm going to.
Hey! Mr. Tambourine Man, play a song for me,
In the jingle jangle morning I'll come followin' you.


Bob Dylan


~ ~ ~


Essa música é extraordinária e tem suas versões disponibilizadas no próprio site do Dylan, aqui. Falho em escolher qual trecho melhor faz jûs ao momento.

retorno da dificuldade de expressão e dicção

domingo, 4 de janeiro de 2009

Retrospectável, 2008, 2/2

guardados os raros, esparsos, curtos e intensos bons momentos,


o segundo semestre de 2008 foi predominantemente uma merda.