quinta-feira, 7 de fevereiro de 2008

17º filha da puta perdedor

Eu não estava em casa, pra começo de conversa. Estava alojado na casa dos meus primos por pouco, mas não sei quanto, tempo. De qualquer maneira saí me sentindo um filha da puta. Peguei carona até o metrô com o primo que dirigia e acompanhei sua namorada até que nossas necessidades nos fizessem tomar rumos diferentes, trens diferentes. Acho que eu fui pro Norte e ela foi pro Sul. Não faz diferença.
Era dia da Parada Gay. E lá estava eu, no metrô, dirigindo-me ao que eu acreditava ser o fim de algo. E o metrô dá acesso a uns quatro ou cinco cantos da cidade, então estava, como sempre, cheio de gente. Mas era dia da Parada Gay. E digo uma coisa, se quer algum dia observar coisas e pessoas novas, mas só quer um pouco e sem muita interação, ande de metrô em dia de Parada Gay. É definitivamente diferente; uma pequena faceta, mas é.
E lá estava eu, indo de metrô ao terminal rodoviário, com a minha cara de filha da puta perdedor. Essa cara é aquela que a gente faz quando pensa "É... poizé. Fazer o quê." e suspira que nem um paspalho. Cara de perdedor. O engraçado é que esses dias anuviados (sem trocadilhos aqui) têm essa denominação por um motivo maroto: não se consegue analisar com clareza as situações, portanto, a verdade é vista nublada e turva. E naquele dia eu me sentia um filha da puta perdedor. E pensando hoje, com a tal clareza, eu era mesmo um filha da puta perdedor. A única diferença é que agora eu sei mais um pouco das coisas e sei muito menos de tudo.
E, engraçado, nesses dias você olha pra todas as pessoas com uma esperança maior. Você pensa em coisas que te consolam, tipo "veja a parte boa, você é um filha da puta solteiro, agora", e toda mocinha elegante e de aspecto inteligente te chama atenção e te parece um alguém legal pra chegar e assoprar as tempestades que te assolam. Mas não é assim que funciona.
Sério, você vai lá no guichê da companhia rodoviária e diz que quer devolver a passagem. "Oi, gostaria de fazer uma devolução", e fica sorrindo que nem um filha da puta perdedor, esperando a atendente olhar pro teu rosto e perguntar "Nossa, por quê?" e você contar como foram seus últimos seis meses, como você arrecadou uma grana, como você comprou uma passagem pra ir atrás de uma guria, como tudo acabou, como você foi babaca e como você veio devolver a passagem. Claro, sem esquecer de mencionar o modo como você se sentia um filha da puta perdedor. Sempre. Mas, putz, todo mundo sabe que isso só acontece em filmes. E nos filmes o cara joga futebol americano, tem uma grana legal e está numa universidade do governo, e só quer trocar as passagens por mero esporte e a atendente é uma estagiária da mesma idade, elegante e com ar intelectual, e não uma mulher com o dobro da sua idade e um anel de noivado na mão. Cena digna de um cara que está longe de um filha da puta perdedor.
Longe, bem longe de mim.
Porque no fim você pegou a grana de volta (com 5% descontado, um absurdo), e você percebe que a grana não vale nada, na real. Suspira que nem um filha da puta perdedor e faz o caminho pra casa, observando as mulditões homossexuais, bissexuais, transsexuais, simpatizantes e afins, pegando a condução junto de monocelhas, comunistas, vadios, universitários, atendentes e filhas da puta perdedores.
Eles tomam o controle das estações e enchem uma das avenidas mais importantes da cidade, pois é o dia deles. Mas o glitter em excesso tira todo o brilho do seu dia de filha da puta perdedor e, portanto, você acha necessário perpetuar o dia pelas próximas semanas, e responde tal qual o filha da puta perdedor que é:
"Ah, acabou."
"Devolvi, né."
"É. Fazer o quê." (suspira)
[...]
"Filha da puta."
Até que o Carnaval chega ao fim e você chega a claras conclusões, juntando ontem e hoje.
E só diz "Dezessete anos. Grande merda", porque não faz diferença, mesmo.
Gastou a grana com sexo, drogas e rock'n roll, da maneira que um perdedor filha da puta faria; o sexo não era de verdade, as drogas não eram ilícitas (sequer previstas pelo Ministério da Saúde) e só comprou material cagado do bom e velho rock'n roll.
Deixa uma porrada de pessoas pra trás. Fecha os olhos que nem um... bem, você sabe o quê.
Guri de dezessete anos. Falta um passo pra você ser finalmente reconhecido como alguém responsável pelos próprios atos.
O tempo de filha da puta perdedor acabou.